Deus não está mais preocupado com o que fazemos do que com a razão pela qual fazemos e é fácil perceber isso nas Escrituras. Esse foi o motivo de Jesus afirmar categoricamente acerca dos fariseus: “Esse povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está longe de mim” (Mt 15.8). Ao mesmo tempo em que declaravam louvores ao Senhor, os fariseus negavam a Palavra e ensinavam seus próprios princípios (Mt 15.9).
Podemos verificar essa mesma verdade no julgamento de Jesus quanto às “boas ações” dos fariseus, por ocasião do sermão do monte. Ali o Senhor os chamou de hipócritas, repreendendo suas ações de dar esmolas (Mt 6.2), orar nas sinagogas e praças (Mt 6.5) e fazer jejum (Mt 6.16). Conquanto essas atitudes não fossem pecaminosas em si mesmas, acabavam se tornando pecado por causa da motivação dos fariseus para fazerem todas elas: “serem glorificados pelos homens”, “serem vistos dos homens” e “com o fim de parecer aos homens”, respectivamente.
Ao invés de buscar o reino de Deus e a glória do Redentor, os fariseus estavam preocupados com seus reinos pessoais e com a glorificação de si mesmos.
Infelizmente essa não era uma realidade exclusiva dos fariseus. Vemos todos os dias cristãos tentando evitar o pecado, também motivados por seus próprios reinos. Isso pode ser verificado em conselhos como: “Não tenha relações sexuais antes do casamento, pois se você engravidar vai estragar sua vida e terá que parar de estudar para se dedicar ao bebê”; ou, “Eduque o seu filho para que não precise passar vergonha na frente dos outros quando ele lhe desobedecer em público”; ou ainda; “Agrade o seu cônjuge para que conceda o carinho de que você precisa”.
Conselhos como esses estão totalmente comprometidos somente com o “reino do eu”, com aquilo que é bom para mim e, por isso, ainda que os jovens sejam castos, os filhos educados e os cônjuges estejam vivendo bem, Deus não está sendo honrado.
Há ainda outra questão. Quando o motivo para se evitar o pecado é algo que “eu” acho que trará uma consequência ruim para o “meu reino”, além de se ter um entendimento distorcido de em que consiste a vida cristã, bastará que “eu” mude de opinião para começar a fazer o que eu antes proibia. Tomando um dos exemplos acima, teríamos alguém evitando sexo antes do casamento para não correr o risco de uma gravidez indesejada. O ensino distorcido que fica claro é: filhos são um problema. Mas se a opinião sobre isso mudar e se entender que ter filhos é algo bom (o que é verdadeiríssimo) não haveria mais a “barreira” para o sexo pré-marital. Se o reino é meu, as regras são minhas e, por conta disso, nunca haverá honra a Deus.
Para que o Senhor seja honrado as razões para não pecar devem emanar da sua Palavra e do entendimento de que o pecado é primeiramente uma afronta à sua santidade. Assim, o relacionamento sexual antes do casamento deve ser evitado porque afronta a Deus (Hb 12.4), os filhos devem ser educados para honrar a Deus (Dt 6.1-7) e os cônjuges dever servir um ao outro porque essa é a vontade de Deus (Ef 5.21-33).
O pecado não é ruim, primariamente, por causa das consequências que traz, mas por causa de quem é primeiramente afrontado, o Santo Deus, e isso deve nortear também a nossa confissão de pecados, que pode revelar um coração arrependido ou simplesmente remorso e aqui estamos, mais uma vez, a tratar de motivações.
Para ilustrar, pense em dois exemplos conhecidos. Sabemos que Judas traiu a Jesus e às vezes nos esquecemos de que Pedro também o fez, quando o negou. A diferença entre os dois foi que Pedro entristeceu-se por ter traído o mestre (Mt 26.75) e mais à frente foi restaurado (Jo 21.15-17), enquanto Judas entristeceu-se por causa da consequência de sua traição, que foi a condenação à morte de Jesus (Mt 27.1-3), e, não conseguindo viver com o remorso, suicidou-se. Os motivos foram bem distintos.
As motivações procedem do coração (Mt 6.21), razão de lermos em Provérbios que “assim como a água reflete o rosto, o coração reflete quem somos nós” (Pv 27.19 - NVI). É o nosso coração que demonstra se vivemos para Deus ou se vivemos para nós mesmos. Diante disso, devemos fazer coro com o salmista e, perante Deus, afirmar: “Guardo no coração as tuas palavras” – com a mesma e correta motivação – “para não pecar contra ti” (Sl 119.11).
Vivendo dessa forma poderemos, como ordenou Paulo, comer, beber, ou fazer qualquer outra coisa sempre motivados por dar toda a glória a Deus (1Co 10.31).
Milton C. J. Junior
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