sábado, 21 de julho de 2018

Você não precisa supor

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Há alguns anos fui pregar em uma igreja pastoreada por um amigo e passei o domingo com ele e sua família. Após a escola dominical, sua esposa foi para casa preparar o almoço e nós passamos em um mercadinho para comprar um molho que havia faltado. Foi quando ele me falou que a esposa estava preparando um escondidinho de carne seca.

Nesse momento já comecei a ficar preocupado. Como não gosto de mandioca, mas sabia que quem estava me recebendo queria me agradar, bolei um plano para comer “sem sentir”. A cada garfada eu tomaria junto um gole da Coca-Cola que estava bem gelada e engoliria praticamente sem mastigar. O plano era perfeito, mas...

Chegamos em casa e ela ainda estava preparando o almoço. Conversa vai, conversa vem, de repente, a pergunta fatal: “Você gosta de escondidinho, né?”. Nesse momento, o plano foi por água abaixo. Como ela perguntou se eu gostava eu teria de falar a verdade (em amor, é claro!). Comecei com um “olha...” e ela já entendeu tudo, ficando bastante embaraçada: “Ai... não acredito... eu tinha que ter perguntado, desculpe”, “vou fazer outra coisa...”.

No fim, combinamos assim: Eu comeria somente carne e eles o escondidinho completo. Certamente a esposa do meu amigo queria muito me agradar, estava fazendo de coração, mas qual foi o erro dela? Supor que eu gostava.

Se eu quero agradar alguém, sem chance de errar, eu não posso supor. Eu devo perguntar do que a pessoa gosta e do que ela não gosta porque, com toda boa vontade do meu coração, se eu não souber do que a pessoa gosta eu posso errar. Suposições são perigosas, principalmente as culinárias, porque pode ser que estejamos enganados.

Muitos crentes querem, ou dizem querer, agradar a Deus. O problema é que, a despeito do que afirmam, não gastam tempo examinando a Palavra, que é onde Deus revelou o que o agrada e o que o desagrada, daí tentam supor o que devem fazer.

Se você quer agradar a Deus, você não precisa supor. Como bem afirmou o salmista a respeito do justo, “no coração, tem ele a lei do seu Deus; os seus passos não vacilarão” (Sl 37.31).

Deus deu a sua Palavra, que é a lâmpada para os pés e a luz para o caminho (Sl 119.105), a fim de que aqueles que foram libertos por Cristo possam viver de modo digno do evangelho (Fl 1.27). É impossível ser salvo por meio do cumprimento da Lei, que só foi cumprida plenamente por Cristo, entretanto, ela continua sendo o padrão para que os filhos de Deus caminhem em santidade, vivendo um padrão de justiça que excede o dos escribas e fariseus (Mt 5.17-20).

Paulo afirma que fomos “criados em Cristo Jesus,” – exatamente – “para boas obras, as quais Deus preparou de antemão para que andássemos nelas” (Ef 2.10). As Escrituras também exortam a seguir a piedade (1Tm 6.11), exercitar-se na piedade (1Tm 4.7), demonstrar que os crentes devem ter a consciência pura diante de Deus e dos homens (At 24.16), desenvolver a salvação (Fp 2.12), em suma, seguir “a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hb 12.14), afinal de contas, os crentes devem ser santos, pois o Senhor o é (1Pe 1.16).

A grande questão é que você nunca vai conseguir viver piedosamente sem o conhecimento da Escritura. Aqueles que buscam agradar a Deus sem, ao mesmo tempo, ater-se ao padrão de santidade que ele determina em sua Palavra estão enganando a si mesmos. E o pior, muitos desses acreditam, de fato, que estão conseguindo levar a cabo o seu intento, pois medem a sua santidade comparando-se a outros que são “menos santos” que eles.

Deus não deixou sua igreja “no escuro”, tentando adivinhar sua vontade. Não! Ele deu um padrão bem objetivo que deve ser conhecido e, na força do Espírito, colocado em prática. Lembre-se que não é somente conhecer, mas também praticar, pois aqueles que ouvem a Palavra e não praticam foram comparados por Jesus a um homem que construiu uma casa sem fundamentos que não pôde se manter diante das intempéries da vida (Mt 7.26-27).

Nesse ponto, alguém pode argumentar que Deus está interessado é na intenção do coração. A isso respondo lembrando a história de Saul. Deus iria castigar os amalequitas e ordenou que Saul destruísse totalmente tudo o que eles tinham, além de matar a todos, incluindo os animais. Saul foi, mas deixou vivo o rei, além de poupar o melhor das ovelhas e bois. Quando Samuel foi até ele e ouviu o barulho das ovelhas e bois, perguntou o que tinha ocorrido. A resposta de Saul foi que ele havia obedecido ao Senhor, mas que o povo poupou o melhor dos animais para sacrificar ao Senhor.

Mesmo sabendo o que Deus havia ordenado, parece que Saul supôs que Deus se agradaria da oferta, afinal de contas, era o melhor das ovelhas e do gado. Mas o que ele ouviu de Samuel deve servir de lição para cada um de nós: “Tem, porventura, o Senhor tanto prazer em holocaustos e sacrifícios quanto em que se obedeça à sua palavra? Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar, e o atender, melhor do que a gordura de carneiros” (1Sm 15.22).

Hoje sabemos que o melhor sacrifício já foi providenciado pelo Senhor, imolando seu próprio Filho para que pudéssemos ser reconciliados com ele e, nesta condição, podermos dar ouvidos às suas Palavras. Você não terá uma vida piedosa sem o conhecimento e prática da Lei do Senhor, portanto, em vez de supor, conheça!

Milton C. J. Junior

sexta-feira, 6 de julho de 2018

Desejos que podem matar

coração (3)“Cada um, porém, é tentado pelo próprio mau desejo, sendo por este arrastado e seduzido. Então esse desejo, tendo concebido, dá à luz o pecado, e o pecado, após ter se consumado, gera a morte” (Tiago 1.14,15 - NVI).

Tiago nos ensina sobre a dinâmica do pecado. Conquanto muitas vezes queiramos dar desculpas para nossas ações pecaminosas, a verdade retratada nesse texto é que pecamos por causa dos desejos do nosso coração. Atente, porém, para um detalhe. Tiago não está falando de qualquer desejo, mas daquele que ele qualifica como “mau desejo”.

Podemos pensar sobre o “mau desejo” em dois sentidos: primeiro, é mau desejo tudo aquilo que é diretamente proibido pela lei de Deus. Só para exemplificar, o desejo de adulterar é em si mau, pois é explicitamente contrário à santa Lei de Deus.

Porém, há outro sentido que devemos considerar. Bons desejos podem tornar-se maus, quando queremos que se concretizem custe o que custar. A Bíblia não proíbe que os filhos de Deus desejem coisas lícitas, mas quando começamos a ser “controlados” por elas a ponto de pecar para conseguir o que queremos ou pecar por não ter conseguido o que queremos significa que um bom desejo tornou-se um mau senhor. Não é sem razão, portanto, que o Senhor Jesus adverte que “onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração” (Mt 6.21).

Quando estamos com os olhos fixos somente nos desejos do coração, acabamos por ignorar as ordenanças do Senhor. Permita-me ilustrar isso.

Sempre gostei muito de mergulhar. Quando coloco máscara, canudo (snorkel) e pés de pato (nadadeiras) e me lanço ao mar, quase me esqueço da vida “aqui fora”. Quando eu era ainda um adolescente, costumava pegar, com amigos, peixinhos ornamentais para vender a um revendedor de peixes de aquário, que havia em minha cidade. Alguns peixes eram mais caros e quando encontrávamos um desses era uma grande alegria. Um dia foi a minha vez de achar um desses. Ele era lindo e logo pensei no dinheiro da venda (que hoje reconheço que não era tanto assim... rs) e no prazer de capturar um daqueles. Tomei fôlego, prendi a respiração e mergulhei atrás. Era um peixe arisco! Eu cercava por um lado com a mão, tentando levá-lo à direção da “redinha” que estava do outro lado e ele se escondia atrás de alguma pedra. A vontade de ter aquele peixinho era tanta que me esqueci de uma lei básica: sem oxigênio eu morro! Quando me vi já quase sem fôlego e olhei para cima, os poucos metros de água até a superfície pareciam quilômetros. Tive de nadar muito rápido e cheguei à superfície ofegante. O desejo pelo peixe me fez esquecer uma lei e isso poderia ter me levado à morte.

Creio que é isso que Tiago está ensinando. O mau desejo me leva a desprezar a lei de Deus e eu peco para consegui-lo ou por não tê-lo conseguido. O que se segue é a morte! O mau desejo se torna senhor, um ídolo, que determina como o homem deve agir, desprezando a Lei do verdadeiro Senhor.

Ao exortar Caim, Deus falou exatamente sobre isso: “Se procederes bem [de acordo com a Lei do Senhor], não é certo que serás aceito? Se, todavia, procederes mal [pecando por obedecer ao desejo], eis que o pecado jaz à porta; o seu desejo será contra ti, mas cumpre a ti dominá-lo (Gn 4.7 – grifo meu).

Embora as Escrituras sejam claras, constantemente deixamos que os desejos tomem conta do nosso coração e se tornem falsos deuses que fazem promessas de alegria, satisfação, paz, tranquilidade, etc. que nunca poderão cumprir. Essa é razão de pecarmos. Se amássemos absolutamente ao Senhor sobre todas as coisas, nunca pecaríamos, pois faríamos sempre a sua vontade. Isso implica que qualquer pecado que cometamos seja uma consequência de um primeiro pecado, a quebra do primeiro mandamento em que Deus nos ordena: “Não terás outros deuses diante de mim” (Êx 20.3).

Muitos servos de Deus têm tomado decisões pautadas não na Lei do Senhor, mas na simples satisfação de seus desejos e têm colhido as consequências trágicas que resultam da desobediência.

É lícito desejar um bom emprego, um bom casamento, a casa própria dos sonhos, o reconhecimento pelo bom trabalho, respeito, liderança na igreja, etc. Todas essas coisas não são más em si mesmas, mas quando estamos dispostos a pecar por elas ou ficamos irritados, irados, mal-humorados, enfim, quando pecamos não respondendo de forma piedosa quando não as conseguimos, estamos diante do “mau desejo” que Tiago afirma que conduz à morte.

O Senhor Jesus nos ensina de forma prática como devemos colocar nossos desejos diante do Pai. Em sua oração, antes de ser preso e morrer em lugar do seu povo, ele expressou seu desejo: “Aba Pai, tudo te é possível; passa de mim este cálice” – entretanto, não se rebelou e submeteu-se a vontade do Pai, que era totalmente diferente do que ele estava pedindo, quando terminou a sua oração – “contudo, não seja o que eu quero, e sim o que queres” (Mc 14.36).

A Bíblia afirma que a vontade de Deus é “boa, agradável e perfeita” (Rm 12.2) e também que “todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito” (Rm 8.28).

Se estivermos convictos dessas verdades poderemos colocar sempre os nossos desejos diante do Senhor, já abrindo mão deles, e afirmar: “faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu” (Mt 6.10), pois saberemos que para nossa alegria e satisfação dependemos somente do Senhor e não daquilo que ele pode ou não nos conceder.

Agindo assim, honraremos sempre o Redentor.

Milton C. J. Junior