quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Você não precisa conhecer o futuro, mas o Senhor

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Em meu primeiro ano de ministério, estive numa região em que, infelizmente, algo se repetia constantemente. Era encontrar os pastores em alguma reunião que logo vinha a pergunta: “Você crê em revelação?”, ao que eu já respondia categoricamente com um sonoro “não”. Digo infelizmente porque pastores presbiterianos deveriam, por dever de ofício na IPB, ser confessionais e, para ser ordenados precisam, necessariamente, subscrever a Confissão de Fé e os Catecismos de Westminster que são documentos cessacionistas.

Em um determinado encontro, resolvi responder à pergunta de forma diferente, buscando conversar mais acerca do assunto. Um pastor se aproximou e já soltou: “Você crê em revelação?”. Desta vez eu disse: “sim, é claro!”, deixando-o animado com a resposta. Logo, então, continuei: “Creio em revelação, inclusive já a li hoje pela manhã!”

De repente, a animação inicial transformou-se num olhar de decepção. O irmão explicou que estava falando de outro tipo de revelação e eu pedi que ele me explicasse mais sobre sua crença. Segundo ele, a revelação à qual se referia dizia respeito a eventos futuros na vida de alguém. O exemplo que ele me deu foi de alguém que iria viajar e que recebeu uma “revelação” na igreja. Foi dito a ele que se ele viajasse, um acidente aconteceria na estrada causando-lhe a morte.

Diante disso, perguntei: “Então este irmão tinha duas opções pela frente: se ele viajasse, morreria, se não viajasse, permaneceria vivo, é isso mesmo?”, ao que o pastor me respondeu afirmativamente. Perguntei, então, acerca do Salmo 139, em que Davi afirma: “Os teus olhos me viram, a substância ainda informe, e no teu livro foram escritos os meus dias, cada um deles escrito e determinado, quando nem um deles havia ainda” (Sl 139.16). Como entender esse texto em relação ao futuro incerto do irmão que recebeu a revelação? Daquele momento em diante reinou o silêncio. Parecia que aquele pastor nunca tinha pensado acerca da implicação do seu entendimento sobre revelação “particular”.

Como ele, muitos cristãos não param para pensar em sua crença e em como elas podem colocá-los em confronto com a Palavra de Deus. Nesse caso, em particular, parece que o desejo de saber sobre o futuro, de ter um direcionamento “mais seguro” por uma revelação direta de Deus, pode ser uma explicação para um entendimento tão distante da Palavra de Deus. A ideia de Deus estar direcionando a vida por meio de uma revelação específica sobre as escolhas a serem tomadas e seus desdobramentos parece dar mais “segurança”, além de retirar das pessoas a responsabilidade ou, no mínimo, fornecer um bom álibi diante das consequências.

Por exemplo, se eu deixo de viajar para um compromisso importante porque Deus me revelou que eu morreria na estrada se fosse, quem me recriminaria pela decisão de não ir, ainda que tenha faltado com minha palavra? E, ainda que houvesse repreensão, eu ficaria em paz comigo mesmo, afinal de contas, eu somente “ouvi a voz de Deus”.

Voltei a pensar nisso dia desses, enquanto dirigia para o escritório ouvindo no carro a narração do livro de Atos. Importa lembrar aqui que em Atos a revelação ainda não está completa e os livros do Novo Testamento estão sendo escritos. Os dons revelacionais estão em plena atividade. Hoje, cremos (pelo menos os que subscrevem a Confissão de Westminster) que “foi o Senhor servido, em diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua Igreja aquela sua vontade; e depois, para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais seguro estabelecimento e conforto da Igreja contra a corrupção da carne e malícia de Satanás e do mundo, foi igualmente servido fazê-la escrever toda. Isso torna indispensável a Escritura Sagrada, tendo cessado aqueles antigos modos de revelar Deus a sua vontade ao seu povo” (CFW I.I).

Dito isso, pense na experiência de Paulo, descrita em Atos 21. Ele estava em Cesareia, na casa de Filipe, quando o profeta Ágabo chegou da Judeia. Ágabo pegou o cinto de Paulo “ligando com ele os próprios pés e mãos [e] declarou: Isto diz o Espírito Santo: Assim os judeus, em Jerusalém, farão ao dono deste cinto e o entregarão nas mãos dos gentios” (At 21.8-11).

Diante de tal revelação, Lucas registra que todos eles pediram a Paulo para não ir à Jerusalém. Isso é totalmente compreensível. Diante do anúncio da prisão em Jerusalém os amigos estavam preocupados.

A resposta e a atitude de Paulo nesta situação têm muito a ensinar, sobretudo a irmãos como o da experiência narrada no início deste texto. O apóstolo questionou: “Que fazeis chorando e quebrantando-me o coração? Pois estou pronto não só para ser preso, mas até para morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus”. Após a Palavra de Paulo, Lucas diz: “Como, porém, não o persuadimos, conformados, dissemos: Faça-se a vontade do Senhor!” (At 21.13-14).

A pergunta a ser feita aqui é: Por que é que Paulo, mesmo sabendo o que aconteceria com ele em Jerusalém, não deixou de cumprir o seu ministério (Cf. At 20.24)? Como se manteve fiel à sua responsabilidade?

A resposta é simples, quando Paulo foi comissionado por Deus, ele ouviu, da parte do Senhor, que ele levaria o nome do Senhor perante gentios e reis e aprenderia o “quanto [...] importa sofrer pelo meu nome” (At 9.15-16). Ele mesmo havia afirmado: “vou para Jerusalém, não sabendo o que ali me acontecerá, senão que o Espírito Santo, de cidade em cidade, me assegura que me esperam cadeias e tribulações” (At 20.22-23).

Paulo toma sua decisão pautado na Palavra que o Senhor lhe dera. A consciência, por meio de uma revelação, do que o esperava, não fez o apóstolo deixar de cumprir o seu chamado, pensando em “mudar a sua sorte” e livrar-se do que o Senhor disse que ocorreria.

Tendo os antigos meios de Deus revelar a sua vontade cessado (Hb 1.1-2) temos tudo aquilo de que precisamos para direcionar a nossa vida na Santa Palavra de Deus. Como afirmou Moisés, “as coisas encobertas pertencem ao Senhor, nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem, a nós e a nossos filhos, para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei” (Dt 29.29).

É triste perceber que muitos que buscam novas revelações para direcionar suas vidas, pouco conhecem daquilo que o Senhor fez registrar nas Escrituras e, exatamente por isso, têm práticas que vão contra a Palavra.

Não precisamos conhecer o futuro. Precisamos conhecer o Senhor Jesus Cristo, como revelado em sua Palavra. Busque, com a iluminação do Espírito de Cristo, encher seu coração da Palavra de Deus a fim de honrá-lo em suas práticas e decisões. Em Cristo, você está seguro!

Milton C. J. Junior

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Vivendo e aprendendo

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O título faz alusão a um dito popular bastante conhecido. Não é difícil encontrar pessoas que, ao passar por situações que acabaram por fazê-las rever conceitos, mudar de atitudes ou descobriram algo novo, costumam logo dizer: “vivendo e aprendendo” ou “é vivendo que se aprende”.

Para muitos, este é o grande lema da vida! Pessoas assim entendem que o aprendizado só é possível à medida em que se vive experiências diversas, sejam elas quais forem.

Entretanto, para aqueles que confessam a Cristo as coisas não precisam ser assim. Na verdade, a Escritura aponta para outro caminho, a saber, “Aprenda para viver”. Você pode verificar isso olhando para a carta de Paulo aos Romanos. Ali o apóstolo afirma que “tudo quanto, outrora foi escrito, para o nosso ensino foi escrito” – e já demonstra a finalidade disso – “a fim de que, pela paciência e pela consolação das Escrituras, tenhamos esperança” (Rm 15.4).

Olhe também para a primeira carta aos coríntios e esta verdade fica ainda mais clara. Você sabe que a igreja de Corinto tinha muitos problemas de pecado que iam desde divisões, passando por imoralidade, soberba e chegando ao ponto de irmãos levarem uns aos outros ao litígio diante de incrédulos.

A despeito disso, aquela igreja se via como muito espiritual e, por isso, no capítulo 10, Paulo lembra àqueles irmãos de várias experiências espirituais vividas pelo povo de Israel no deserto mostrando que, apesar de todas essas experiências, “Deus não se agradou da maioria deles, razão por que ficaram prostrados no deserto” (1Co 10.1-5).

O objetivo de Paulo relatar isso é bem claro. Ele mesmo diz: “Ora, estas coisas se tornaram exemplos para nós, a fim de que não cobicemos as coisas más, como eles cobiçaram” (1Co 10.6). Aqueles irmãos e nós temos o grande privilégio de ter acesso a tudo aquilo que o Senhor mandou registrar em sua bendita Palavra para vivermos uma vida reta aos seus olhos.

Não precisamos passar pelo mesmo que passaram irmãos nossos do passado. Seus erros e a forma como Deus os tratou estão diante de nossos olhos e precisamos aprender com a história para viver de modo digno do evangelho de Cristo. Muitos dos nossos irmãos do passado já caíram em pecados que nós poderíamos evitar se atentássemos para a história e crêssemos de todo o coração no que Deus ordena em sua Palavra, afinal de contas, ela nos foi dada para ser a lâmpada para os nossos pés e a luz para o nosso caminho (Sl 119.105).

Mas, infelizmente, não são poucas as vezes que, mesmo sabendo o que está na Escritura, acabamos por tomar caminhos segundo os desejos e inclinações pecaminosas do nosso coração. Desejos e inclinações totalmente opostos ao que o Senhor revela em sua Palavra.

Quando isso acontece, certamente somos corrigidos pelo Senhor. O escritor da epístola aos Hebreus lembra os seus leitores, que estavam tentados a desistir de sua caminhada por causa das perseguições: “Ora, na vossa luta contra o pecado, ainda não tendes resistido até ao sangue e estais esquecidos da exortação que, como a filhos, discorre convosco: Filho meu, não menosprezes a correção que vem do Senhor, nem desmaies quando por ele és reprovado; porque o Senhor corrige a quem ama e açoita a todo o filho a quem recebe. É para a disciplina que perseverais (Deus vos trata como filhos); pois que filho há que o pai não corrige?” (Hb 12.47).

O resultado dessa correção é maravilhoso. Ainda que passemos por aflições, seremos levados à Palavra do Senhor. “Foi-me bom ter eu passado pela aflição, para que aprendesse os teus decretos” (Sl 119.69), disse o salmista.

Tudo isso ocorrerá, pois aquele que começou a obra de redenção em nossa vida certamente a completará até a vinda do Senhor Jesus Cristo (Fp 1.6).

Ele nos concedeu a sua Palavra a fim de aprendermos a viver de modo digno do Evangelho. Ele nos deu o seu Espírito que nos guia a toda a verdade (Jo 16.13). Ele nos disciplinará sempre que necessário, a fim de voltarmos ao caminho.

Portanto, cuidemos de nos dedicar ao conhecimento da Escritura, a Palavra viva e eficaz de Deus (Hb 4.12). É o conhecimento da Lei do Senhor que nos habilitará a cumprir o papel de testemunhas que nos foi outorgado, vivendo como sal da terra e luz do mundo.

Aprenda para viver para a glória de Deus junto à sua família, na vida em sociedade, nos seus negócios. Essa é a vida abundante que o Senhor Jesus nos deu. Quando Josué assumiu o comando do povo de Deus para levá-lo à terra prometida, ouviu do Senhor que não deveria cessar de falar sobre o Livro da Lei, mas antes disso ele deveria meditar “nele dia e noite, para que tenhas o cuidado de fazer segundo tudo quanto nele está escrito” (Js 1.8). A promessa que decorreu dessa ordem à Josué foi: “então, farás prosperar o teu caminho e serás bem-sucedido”.

Aqueles que aprendem para viver serão semelhantes ao homem bem-aventurado do salmo primeiro, cujo prazer está na lei do Senhor, na qual medita dia e noite e “tudo quanto ele faz será bem sucedido” (1.3c). Aqueles que, mesmo conhecendo a Escritura, tentam trilhar seus próprios caminhos, serão disciplinados e santificados pelo Senhor.

Você pode aprender para viver e ser abençoado ou viver para aprender, sendo disciplinado pelo Senhor. Neste caso, a bênção é que, ainda que a disciplina, no momento não seja motivo de alegria, ao final produzirá fruto de justiça (Hb 12.11). Escolha o seu caminho!

Milton C. J. Junior

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Deus nos deu spoiler

Eu gostava muito, por achar bastante criativa, de uma propaganda antiga de certo aparelho videocassete que mostrava uma criança correndo de um lado para o outro na frente da fila que se formou em frente à bilheteria do cinema e que gritava: “a mocinha morre no fina-al!”, “quem matou foi o marido, quem matou foi o marido”, enquanto fazia careta para os que estavam na fila e que olhavam para ele com cara de frustrados.

O objetivo da propaganda era mostrar que a forma mais segura de assistir a um filme sem alguém estragar, contando o final, era em casa, no videocassete. Em meados da década de 90, o spoiler era assim, ao vivo. Spoiler é a revelação de informações sobre o conteúdo de livros ou filmes a quem ainda não os tenha lido ou assistido.

Os tempos mudaram, mas a maioria das pessoas continua não gostando de spoilers. Em tempos de rede social e sites de entretenimento, não é incomum quando alguém vai fazer comentários a respeito de filmes avisar de antemão: “Atenção! Contém spoiler!”, a fim de não se acusado de ser estraga-prazeres pelos leitores desavisados.

Saber de antemão o final de um filme faz perder toda a graça, tira toda a emoção e surpresa e muitos até desanimam de assistir. O interessante é ir descobrindo o que acontecerá, como o mocinho conseguirá se safar e de que maneira os fatos se “encaixarão” no enredo.

Curiosamente, o que é esperado ao se assistir um filme não é apreciado na vida real. Nela não queremos surpresas. Queremos que as coisas aconteçam exatamente como planejamos e quando as mínimas coisas saem do controle vêm o estresse, a irritação, o desânimo, a ansiedade, a depressão, etc.

Um acidente de trânsito que causa atraso em um compromisso leva um homem à ira; a notícia de uma doença séria traz ansiedade e desânimo; a incapacidade de um pai ou uma mãe de saber onde está o filho que ainda não chegou no destino e que não atende o celular leva os nervos à flor da pele, a instabilidade financeira e a falta de perspectivas levam jovens a questionar se a vida vale a pena...

Há um problema ainda maior. Por mais que não gostemos de que as coisas saiam do controle, não temos a mínima capacidade de controlar as circunstâncias de nossa vida. Diante disso, Tiago exorta: “Atendei, vós que dizeis: Hoje ou amanhã iremos para a cidade tal, e lá passaremos um ano, e negociaremos, e teremos lucros. Vós não sabeis o que sucederá amanhã. Que é a vossa vida? Sois, apenas, como neblina que aparece por instante e logo se dissipa” (Tg 4.13-14). A realidade é que não sabemos nem quanto tempo de vida teremos.

As palavras de Tiago poderiam levar alguns a uma angústia inquietante e uma preocupação diária com o dia de sua morte. Entretanto, ele continua: “Em vez disso, devíeis dizer: Se o Senhor quiser, não só viveremos, como também faremos isto ou aquilo” (Tg 4.15). Note que não há problema no planejamento em si, ele é até estimulado nas Escrituras. O problema está em achar que as coisas acontecerão de acordo com a nossa vontade, mesmo sabendo que “o coração do homem traça o seu caminho, mas o Senhor lhe dirige os passos” (Pv 16.9). Tiago exorta seus leitores a confiar no Senhor.

No grande filme da vida, o autor, produtor e diretor é o grande Deus e Pai do nosso Senhor Jesus Cristo e para que pudéssemos estar bem seguros ele nos deu “spoiler”. Pedro afirma que tudo o que necessitamos para vida e piedade já nos foi doado na revelação de Jesus Cristo. Em Cristo, foram doadas as grandes promessas de Deus, a fim de que nos livremos das paixões do mundo (cf. 2Pe 1.3-4). Paulo diz que “tudo quanto, outrora, foi escrito para o nosso ensino foi escrito, a fim de que, pela paciência e pela consolação das Escrituras, tenhamos esperança” (Rm 15.4).

Desde o início, Deus tem dado promessas que dão segurança ao que crê. Ao primeiro casal, após a queda, ele afirmou que da mulher viria aquele que iria esmagar a cabeça da serpente (Gn 3.15). No decorrer da revelação do Antigo Testamento, muitos outros aspectos acerca do Messias foram dados. Ele viria da tribo de Judá (Gn 49.10), nasceria de uma virgem (Is 7.14), na cidade de Belém (Mq 5.2), seria o próprio Deus Forte sobre os ombros de quem estaria o governo (Is 9.6), morreria pelos pecados daqueles que ele graciosamente justificaria (Is 53) e essas são apenas algumas das profecias.

Ainda assim, em seu ministério, Jesus foi confrontado por muitos, incluindo mestres da lei, que questionavam quem ele era. Em uma dessas ocasiões o Senhor afirmou: “Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus” (Mt 22.29). Para saber a respeito daquele que ali estava, era necessário conhecer o que Deus houvera revelado.

Jesus morreu, conforme as Escrituras, e ressuscitou, conforme as Escrituras (1Co 15.3-4). Se, como eu, você crê nisso, sabe que o Senhor cumpriu cada palavra dita de antemão. Isso, por si só, deveria ser motivo suficiente para estarmos seguros, deixarmos de lado as preocupações, termos alegria a despeito das circunstâncias e confiar de todo o coração em nosso Redentor.

Mas o Senhor nos revela muito mais. Pela Escritura, sabemos que teremos aflições (Jo 16.33), que podemos ser perseguidos (2Tm 3.12), que estaremos expostos às tentações (Lc 22.40), que por amor do Senhor somos entregues à morte o dia todo (Rm 8.36), etc. Entretanto, sabemos também que “em todas essas coisas, porém, somos mais que vencedores por meio daquele que nos amou” (Rm 8.37), que nada pode nos separar do amor de Deus que está em Cristo (Rm 8.38-39), que a boa obra iniciada em nós será completada (Fp 1.6), que estamos sendo santificados para ser apresentados como sua noiva, Igreja gloriosa (Ef 5.27), que todas as coisas cooperam para o nosso bem (Rm 8.28), que até mesmo os nossos fios de cabelo estão contados (Mt 10.30). Mais ainda, temos a garantia de que o Senhor estará conosco “todos os dias até à consumação dos séculos” (Mt 28.28).

Diante das angústias, das lutas e dos dilemas da vida, quando as coisas parecerem estar fora de controle, lembre-se destas promessas. Lembre-se de que o final não é incerto. O grande autor do filme da vida já nos contou o final:

Vi novo céu e nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe. Vi também a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do céu, da parte de Deus, ataviada como noiva adornada para o seu esposo. Então, ouvi grande voz vinda do trono, dizendo: Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles. Eles serão povos de Deus, e Deus mesmo estará com eles. E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram. E aquele que está assentado no trono disse: Eis que faço novas todas as coisas. E acrescentou: Escreve, porque estas palavras são fiéis e verdadeiras (Ap 21.1-5).

Deus nos deu spoiler, mas este não causa frustração e desânimo em ver o filme, antes nos enche de esperança, segurança e nos faz ansiar pelo grande final, por aquele que diz: “Certamente, venho sem demora. Amém!” por isso clamamos – “Vem, Senhor Jesus!”.

Milton C. J. Junior

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Amar a quem?

Em nossos dias a palavra “amor” tem perdido completamente o seu sentido e isso ocorre porque a compreensão sobre ela é equivocada. Um poeta secular, ao falar sobre esse assunto, expressa sua compreensão dizendo que o amor não é imortal, posto que é chama, mas deve ser infinito enquanto durar.

Isso se agrava ainda mais quando não se têm uma compreensão bíblica sobre o alvo do amor. A ênfase no amor-próprio como requisito para outras “conquistas” é difundida por todos os lados. Uma música da década de 80 serve para exemplificar isso, na última estrofe e no refrão temos:

Foi tão difícil pra eu me encontrar,

é muito fácil um grande amor acabar,

mas eu vou lutar por esse amor até o fim

não vou mais deixar eu fugir de mim.

Agora eu tenho uma razão pra viver,

agora eu posso até gostar de você.

Completamente eu vou poder me entregar,

é bem melhor você sabendo se amar.

Eu me amo, eu me amo,

não posso mais viver sem mim”[

Eu me amo - Ultraje a rigor] (grifos meus)

Essa forma de pensar é encontrada também nas igrejas que assumiram o “dogma” da autoajuda.

A Escritura, porém, caminha na contramão de tudo isso. Vemos no Evangelho que, ao ser questionado por um intérprete da Lei sobre qual seria o grande mandamento, Jesus respondeu que o principal era amar a Deus de todo o coração, alma e entendimento e que o segundo era amar ao próximo como a si mesmo. Disse mais ainda: “Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas” (Mt 22.40). Devemos notar que Jesus não fala em momento algum de amor próprio, ainda que muitos tentem enxergar no texto este “terceiro mandamento”, demonstrando um total descompromisso com a interpretação do texto.

O mais espantoso é perceber que raciocínio dos cristãos que pensam assim é semelhante ao do autor da música citada acima: se alguém não se ama não conseguirá amar o próximo.

Esse “terceiro mandamento” não está no texto por uma simples razão: o homem, por natureza, já se ama demais e não precisa ser estimulado a se amar mais ainda. Jesus parte do princípio de que esse amor por si mesmo já existe. As palavras de Paulo corroboram esse pensamento. O apóstolo afirma: “Porque ninguém jamais odiou a própria carne; antes, a alimenta e dela cuida” (Ef 5.29).

Quando a Escritura menciona o amor próprio, trata-o como um problema: “Sabe, porém, isto: nos últimos dias, sobrevirão tempos difíceis, pois os homens serão egoístas (amantes de si mesmos na versão Revista e Corrigida de Almeida)” (1Tm 3.1,2), afirma Paulo a Timóteo.

A despeito disso, várias publicações cristãs e inúmeros pregadores têm afirmado que o homem deve amar a si mesmo. Com isso, ensinam que o homem precisa fazer justamente aquilo que a Escritura aponta como um dos males dos últimos tempos.

Se queremos honrar a Deus agindo de forma bíblica precisamos entender o que a Escritura, de fato, ensina sobre o amor e o que ela requer que façamos. Somos alvo do amor maior, o amor do Senhor demonstrado na cruz do Calvário, e, por isso, podemos e devemos amá-lo da forma correta, colocando-o em primeiro lugar em nossas vidas e também dispensando esse amor ao próximo.

Segundo Paulo, “o amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor jamais acaba” (1Co 13.4-8). Esse amor deve ser sem hipocrisia (Rm 12.9), cordial, fraternal, preferindo o próximo em honra (Rm 12.10), edificante (1Co 8.1), demonstrado de fato e de verdade (1Jo 3.18).

Somos exortados a não nos conformar com este século (Rm 12.1-2) e, por isso, devemos deixar de lado o que o mundo ensina sobre o amor egoísta (amor próprio) e viver o amor bíblico, por Deus e pelo próximo, para a glória daquele que nos amou primeiro.

Milton C. J. Junior

terça-feira, 1 de outubro de 2019

Tenha bons argumentos, mas... confie no Senhor!

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Dia desses vi uma postagem no Facebook em que um cristão tenta colocar os ateus em maus lençóis. O meme era mais ou menos assim: mostrava um ateu dizendo que não é possível provar que Deus existe, seguido de um texto em que se pedia para refutar uma série de argumentos como o “argumento ontológico”, o “argumento teleológico”, o “argumento do desígnio”, dentre muitos outros, com uma imagem do ateu com cara de espanto depois disso tudo.

A ideia da imagem é refutar o argumento ateu de que cristãos têm uma crença sem fundamento algum. Em seu precioso livro, Crer é também pensar, John Stott afirma que “é um grande erro supor que a fé e a razão são incompatíveis. A fé e a visão são postas em oposição, uma à outra, nas Escrituras, mas nunca a fé e a razão. Pelo contrário, a fé verdadeira é essencialmente racional, porque se baseia no caráter e nas promessas de Deus. O crente em Cristo é alguém cuja mente medita e se firma nessas certezas”.

Stott acerta em cheio. As Escrituras não nos chamam à uma fé cega ou à um “salto no escuro”. O apóstolo Pedro ordena aos cristãos que santifiquem a Cristo no coração, “estando sempre preparados para responder (no grego, apologia = argumento raciocinado) a todo aquele que pedir razão da esperança que há em vós” (1Pe 3.15).

Entretanto, ainda que eu saiba que a fé cristã não é irracional nem ilógica, preocupo-me como fato de muitos cristãos estarem entrando em uma guerra contra ateus apenas para não parecerem bitolados, esquecendo-se que até a apologética (explicação e defesa da fé) deve ter como fim a glória de Deus e o desejo de levar pecadores aos pés do Redentor. A defesa da fé preocupada apenas em provar a existência de Deus, sem apontar para Cristo, pode até levar ateus a se tornarem teístas, mas teístas que não creem no “único Deus verdadeiro” e em Jesus Cristo, enviado por ele (cf. Jo 17.3), terão o mesmo destino dos ateus, a danação eterna.

É preciso crer em Cristo, como diz a Escritura (Jo 7.38) e essa fé salvadora, apesar de racional, é dom de Deus (Ef 2.8). A pregação cristã requer bons argumentos, mas, em última instância, depende totalmente daquele que pode abrir os corações. Uma pessoa pode chegar à conclusão de que a fé cristã é plausível, de que ela faz sentido e, ainda assim, não crer em Cristo.

Penso que um bom exemplo do que eu estou afirmando aqui pode ser visto no episódio em que Paulo discursa perante o rei Agripa, registrado no capítulo 26 de Atos dos apóstolos. Ele inicia sua defesa dizendo-se feliz por poder falar de sua fé diante de Agripa que era “versado em todos os costumes e questões que há entre os judeus” (26.3).

No começo do seu arrazoado Paulo fala sobre sua vida como fariseu, o que era de conhecimento de todos os judeus, e de que estava sendo julgado por causa da esperança na promessa que Deus havia feito aos seus antepassados. Em sua caminhada ele havia se oposto à igreja perseguindo os santos, castigando-os, obrigando-os a blasfemar, tendo, inclusive, prendido a muitos e dado o seu voto para que outros tantos fossem mortos (26.6-11).

O apóstolo passa, então, a narrar sua conversão, no caminho de Damasco, e seu chamado para ser ministro e testemunha de Cristo. Paulo afirma ao rei não ter sido desobediente e conta de como começou a proclamar a Cristo, o que estava fazendo também perante Agripa (26.12-23).

Nesse ponto Paulo é interrompido por Festo que o acusa de estar louco e delirando, por conta das “muitas letras”. Diante disso, ele afirma o que quero destacar para provar meu ponto: “Não estou louco, ó excelentíssimo Festo! Pelo contrário, digo palavras de verdade e de bom senso (26.25). Repare bem o que Paulo diz. Ele afirma que está falando a verdade. Suas palavras fazem sentido, elas têm nexo, coerência e são plausíveis. O apóstolo afirma ainda que tudo o que estava dizendo era de conhecimento de Agripa (que ele já havia dito que era versado nos costumes e questões dos judeus), e dirige uma pergunta diretamente ao rei: “Acreditas, ó rei Agripa, nos profetas? Bem sei que acreditas” (26.27).

Com esta pergunta Paulo está colocando o rei em xeque. Conhecedor como era dos costumes judeus e exposto ao arrazoado de Paulo, ele deveria render-se à argumentação, mas, diferente do que eu já li alhures, de que Agripa era um “quase salvo”, mas fatalmente perdido, tendo “quase” crido no evangelho, ele responde com ironia. A tradução da NVI capta bem o sentido do que ele diz: “Você acha que em tão pouco tempo pode convencer-me a tornar-me cristão?” (26.28).

A resposta de Paulo não deixa dúvidas de que, a despeito de bons argumentos, a obra de convencimento do pecador pertence a Deus: Assim Deus permitisse que, por pouco ou por muito, não apenas tu, ó rei, porém todos os que hoje me ouvem se tornassem tais qual eu sou, exceto estas cadeias” (26.29 – ênfase minha), e é assim que devemos crer.

Portanto, tenha bons argumentos e dedique-se ao estudo sério e sistemático das Escrituras. Não deixe, entretanto, que isso o conduza ao orgulho e a soberba de achar que são os seus bons argumentos que convencerão pecadores a crer no Deus da Bíblia. Essa é uma obra exclusiva do Espírito de Deus, que muda corações. Confie nele!

Milton C. J. Junior