terça-feira, 25 de junho de 2019

Perdão - uma questão de obediência

forgiveness

Um dos maiores desafios na vida cristã é o exercício do perdão, e um fato que comprova essa tese está registrado no Evangelho segundo escreveu Lucas. No capítulo 17.3-10 o Senhor ensinou aos discípulos que se um irmão pecasse contra eles deveria ser repreendido e, havendo arrependimento, deveria ser perdoado. Ensinou ainda que, se durante sete vezes no dia o irmão pecasse e voltasse arrependido, deveria ser perdoado.

Diante de um ensino tão difícil de ser colocado em prática, os discípulos pedem ao Senhor: Aumenta-nos a fé!

É importante perceber que o Senhor Jesus não diz em momento algum que faria isso acontecer, mas lhes conta uma parábola sobre um senhor e seu servo. Jesus começa perguntando se, tendo um servo, os discípulos deixariam que ele, ao chegar cansado do trabalho na lavoura ou com o gado, se assentasse para comer antes de lhes servir. O mestre pergunta ainda se o senhor teria de agradecer ao servo porque havia feito o que lhe foi ordenado.

A resposta era lógica! Os discípulos tinham plena consciência de que o senhor poderia fazer quaisquer exigências ao servo, que, mesmo cansado, deveria efetuar o trabalho sem esperar qualquer recompensa por isso. Fica fácil perceber esse ponto no desfecho da parábola: “Assim também vós, depois de haverdes feito quanto vos foi ordenado, dizei: somos servos inúteis, porque fizemos apenas o que devíamos fazer” (Lc 17.10).

Diante do exposto, entendemos que, com essa parábola, o Senhor estava ensinando aos discípulos que eles deveriam ser obedientes ao seu ensino sobre o perdão porque ele estava ordenando. Se é verdade que o servo deveria obedecer ao senhor, muito mais os discípulos a Jesus. Aprendemos então que perdoar não é questão de ter uma fé grandiosa, mas de atender à ordem do nosso Senhor. Aqueles que obedecem podem orar como ele ensinou: “Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores (Mt 6.12), atentando às suas palavras após o ensino dessa oração: “Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará; se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas” (Mt 6.14,15).

A despeito disso, muitos cristãos têm agido de forma parecida com os discípulos, mas em vez de dizerem que não têm fé suficiente para perdoar, dizem que ainda não sentiram no coração e que no dia em que isso acontecer, irão “liberar perdão”. Costumo brincar que “sentir no coração” é motivo de se procurar um cardiologista, mas que não tem nada a ver com o ensino bíblico a respeito do perdão. Lembre-se que o perdão está atrelado ao amor. Deus nos perdoa porque nos ama e deu seu Filho como propiciação pelos nossos pecados. Assim, por amor a Deus e ao próximo, precisamos perdoar aqueles que nos procuram arrependidos. Imagine se você precisasse “sentir no coração” a fim de cumprir o mandamento bíblico de amar? Você acha que surgiria em algum momento um sentimento de amor pelos inimigos a quem o Senhor o ordena amar? É claro que não. Mais uma vez é preciso lembrar que a questão aqui diz respeito à obediência. O Senhor ordena, seus servos obedecem.

Resta ainda uma questão: E se a pessoa que pecou contra mim não está arrependida? Devo perdoá-la? Jesus ensina em Mateus 18.15-20 que se um irmão peca contra nós devemos ir até ele e argui-lo e, se ele nos ouvir, está resolvido o problema. Se não ouvir, devemos chamar testemunhas e procurá-lo novamente; depois a igreja, e, se não ouvir também a igreja, aí o processo é de disciplina: ele deve ser considerado gentio e publicano.

Há ainda mais uma questão. Você não vai até alguém que pecou contra você, sem tentar ganha-lo, como ensina Mateus 18, e simplesmente diz que o perdoou. O máximo que você talvez conseguirá com isso será o desprezo, talvez acompanhado da pergunta: “E eu estou te pedindo perdão, por acaso?”. O ponto aqui é o seguinte, o perdão é condicional ao arrependimento. É claro que você deve estar disposto a perdoar, como podemos perceber no texto de Marcos 11.25. Nesta passagem Jesus que “quando estiverdes orando, se tendes alguma coisa contra alguém, perdoai, para que vosso Pai celestial vos perdoe as vossas ofensas”. Você perdoa em seu coração e, se a pessoa vier arrependida ou se arrepender ao ser confrontada por você, você declara o seu perdão, mas não antes disso. Comentando esta passagem Jay Adams afirma que “na oração não se ‘finge’ perdoar outro, nem comunicar-se com os mortos. O que se faz é expressar a Deus sua preocupação genuína de se reconciliar com seu irmão (se possível) e sua vontade de conceder perdão a ele. Sua oração é a Deus, e uma vez que você não concede perdão a Deus, a palavra ‘perdoar’, no versículo, deve ser utilizada, por extensão, para expressar a disposição de perdoar outro”[1].

Uma coisa é certa: seja o irmão nos procurando arrependido ou sejamos nós a procurá-lo para que se arrependa, o perdão é uma obrigação, para que andemos como ordena Paulo: “se possível, quanto depender de vós, tende paz com todos os homens” (Rm 12.18).

Milton C. J. Junior


[1] Jay Adams. De perdoado a perdoador. Ed. Monergismo, p. 43

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