O Senhor me concedeu o imenso privilégio de cuidar de suas ovelhas. Estou bem certo de que aquilo que aspirei, o episcopado, é, de fato, uma grande obra a se almejar (1Tm 3.1) e sou muito agradecido a Deus poder pastorear a Igreja Presbiteriana da Praia do Canto.
O ministério pastoral consiste, em grande parte, em se afadigar no ensino. Paulo afirmou a Timóteo que se ele expusesse a sã doutrina aos irmãos, seria um bom ministro de Cristo Jesus (1Tm 4.6). É claro que para isso ele precisaria também ser “padrão dos fiéis, na palavra, no procedimento, no amor, na fé, na pureza” (1Tm 4.12). Em outras palavras, a vida de Timóteo deveria ser coerente com “as palavras da fé e da boa doutrina” que ele seguia e precisava ensinar.
Como pastor, tenho procurado viver desta forma, o que é um grande desafio, não só para mim, mas também para aqueles que têm aprendido com o meu ensino, afinal o ensino visa à maturidade da igreja para que esta viva, também, de forma coerente com a fé que professa. Nessa caminhada de fé, somos alertados pela Escritura de que “a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si” (Gl 5.17), daí a exortação para que, pelo Espírito, mortifiquemos os feitos do corpo (Rm 8.13). Essa é a luta cristã!
Entretanto, sei também que minha primeira responsabilidade é com um rebanho menor. O mesmo apóstolo que afirmou que o episcopado é uma excelente obra a se almejar listou entre os requisitos para o candidato que ele “governe bem a própria casa, criando os filhos sob disciplina, com todo o respeito (pois, se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará da igreja de Deus?)” (1Tm 3.4,5).
Tenho a grande alegria de ter uma esposa maravilhosa e dois lindos filhos que preciso pastorear. Com minha esposa, tenho procurado educar meus filhos na disciplina e admoestação do Senhor, o que também ensino a todos os pais que eu pastoreio ser sua responsabilidade em seus lares. Essa é outra luta constante, reservar tempo na correria diária com os compromissos do trabalho para estar ministrando a eles.
Quanto exorto minhas ovelhas, que são pais, a se dedicarem mais ao pastoreio do lar, não o faço como alguém que faz isso com muita facilidade, mas como alguém que, como eles, precisa lutar, não poucas vezes, com a indisposição, com a preguiça e com a vontade de fazer algo que nem é tão importante, mas que o coração, muitas vezes, anseia.
É nessa caminhada de pastoreio da família onde consigo perceber mais nitidamente as minhas falhas. É esse meu pequeno rebanho que percebe mais facilmente minhas incoerências e é, principalmente, junto dele que constato as minhas fraquezas, diante das quais rogo ao Senhor que me ajude a ser coerente com o meu ensino, pois estou convicto de que sem a pessoa do meu Redentor, Cristo Jesus, nada posso fazer (Jo 15.5).
Um dia desses, experimentei mais uma vez um desses momentos com minha filha mais velha, Fernanda, que tem apenas 8 anos e tem sido constantemente instruída. Ela já conhece muitas histórias bíblicas, alguns pontos doutrinários importantes, além de saber de cor as respostas às 148 perguntas do “Meu catecismo de doutrina cristã”. À medida que ela ia decorando, íamos explicando o que significava, na prática, aquilo que ela estava aprendendo. Isso tudo, fora as lições que ela aprende na Escola Dominical. Sou um privilegiado por poder ensina-la e ela uma privilegiada por estar em um lar que ama o Senhor, aprendendo tudo isso.
Pois bem, fui com minha família à casa de minha mãe e em determinado momento estávamos assentados no quintal, conversando com minhas irmãs. Com esse nosso mundo “digital”, houve um momento em que começamos a mostrar vídeos de esquisitices que acontecem no meio evangélico e que acabam virando motivo de deboches na internet. Coloquei um vídeo de um neopentecostal cantando que “era pipa avuada” e enquanto ríamos (eu e uma de minhas irmãs) Fernanda passou, foi ver do que estávamos rindo e ao ouvir a música perguntou com toda a inocência: “Isso não é tomar o nome de Deus em vão?”.
Instantes de silêncio constrangedor. Segundos que parecem ter durado muito mais tempo, até eu responder meio sem graça: “Sim, é”, para depois ouvir a pergunta que veio de volta: “E por que vocês estão assistindo?”. Não havia o que fazer, a não ser parar de assistir, envergonhado. Desse dia para cá, venho pensando em algumas questões:
1. Não posso baixar a guarda em momento algum. Momentos de descontração não são desculpa para o pecado. Mesmo na diversão é preciso honrar o nome do Salvador;
2. As ovelhas do meu pequeno rebanho precisam ver coerência em mim. Não posso cobrar dos meus filhos aquilo que eu mesmo não estou colocando em prática;
3. Preciso ser paciente com meus filhos. Citei algumas coisas que Fernanda já sabe sobre a Escritura, não para exalta-la, mas para fazer uma consideração. O problema é que, por saber que ela conhece o que deve ser feito, muitas vezes eu cobro dela um comportamento correto, ficando impaciente ao não ver mudanças que julgo que JÁ deveriam ter acontecido. A questão aqui é: Eu sei muito, mas muito mais do que ela e, ainda assim, estava a ver o tal vídeo “engraçado”. Não fosse a longanimidade de Deus comigo…;
4. Precisamos (eu, ela, meu filho, minha esposa e você que me lê) desesperadamente do Senhor Jesus Cristo. É uma realidade comprovada dia a dia. Nunca mudaremos por simplesmente saber alguma coisa. É verdade que a quem muito é dado dele muito será exigido (Lc 12.48), mas é igualmente verdadeiro que a mudança não se dá porque se conhece intelectualmente, mas pela aplicação da Palavra, realizada pelo Espírito de Cristo, no coração do pecador. Somente estando em Cristo e amparado por sua graça podemos saber e fazer;
5. Preciso lembrar em todo o momento que não é o que eu faço, mas o que Cristo fez, que me torna aceitável diante de Deus. De outra forma me tornarei, simplesmente, um legalista, esperando Deus me dar os parabéns por cumprir de forma exemplar e para a minha própria glória a sua Lei, que me foi dada para eu ser santo, me ajudar a morrer para mim mesmo e viver para a glória de Deus;
6. Preciso lembrar sempre de agradecer o perdão que tenho em Jesus Cristo, aquele que se deu por mim e que me libertou a fim de eu poder servir “a Deus de modo agradável, com reverência e santo temor” (Hb 12.28).
Louvo a Deus por meu pequeno rebanho. Por meio dele posso aprender a cada dia como me portar também diante das minhas outras ovelhas, parte do rebanho de Cristo que ele me confiou. Louvo a Deus pela vida comunitária com o povo de Deus, onde as circunstâncias acabam por revelar nossas fraquezas, nos fornecendo, assim, a oportunidade diária de, por meio de Cristo, crescer em graça e em conhecimento diante do Senhor.
Sigo olhando para Cristo, aquele que cumpriu perfeitamente toda a Lei, a fim de que eu pudesse ser reconciliado com o Pai, crescer em santidade e viver para a glória dele, como uma ovelha do seu rebanho, como pastor da minha família e como pastor da igreja que ele me confiou.
Milton C. J. Junior
Muito bom Rev; Soli Deo Glória.
ResponderExcluirLeitura muito edificante!
ResponderExcluirOi Conceição, bom "vê-la" por aqui! Deus a abençoe.
Excluir